domingo, fevereiro 11, 2007

Grutas de Lapas



Lapas

As margens do Almonda coincidentes com a actual povoação de Lapas foram decerto ocupadas por povoadores muito antigos.
Há algumas décadas, quando se procedia a obras numa fábrica, foram postos a descoberto importantes vestígios neolíticos: machados, enxós, cerâmicas e outros artefactos votivos, indiciadores da existência de uma necrópole.
A origem do aglomerado perde-se nos tempos medievais.
A confraria do aglomerado, cujo compromisso data de 1212, é bem reveladora da antiguidade da povoação.
De resto, em 1527, ano em que se efectua o primeiro cadastro da população do reino, a aldeia contava com cerca de 400 habitantes, assumindo relativa importância no contexto da região e em particular do concelho de Torres Novas, do qual foi sempre o segundo aglomerado até quase aos nossos dias.
O passado medieval de Lapas espelha-se bem na configuração actual da povoação. Implantada num pequeno morro próximo do rio, desenvolve-se numa sucessão de ruelas estreitas e curiosos recantos que lhe conferem singular beleza e tipicismo.
Em Lapas, recorda um velho dito popular, “os vivos andam por baixo dos mortos”. É que, sob as casas e a Igreja onde antigamente perto dela se faziam enterramentos, desenvolve-se uma extensa e intrincada rede de grutas. As grutas que deram nome à povoação e delas constituem o verdadeiro “ex-libris”.

As grutas

As galerias hoje abertas ao público e guardadas como Imóvel de Interesse Público são apenas parte de uma rede muito mais vasta que, grosso modo, percorria quase todo o morro onde assenta a povoação. A geologia do solo – calcário mole conhecido por “tufo” – explica a relativa facilidade com que, em tempos, a mão do homem talhou esta singular preciosidade arqueológica.
De quando as grutas de Lapas?
De tempos neolíticos, como defendem alguns – poucos – historiadores que se debruçaram sobre o assunto? Ou antes construídas para refúgio de cristãos primitivos aquando de perseguições dos Romanos?
Uma lenda bastante enraizada no imaginário popular diz que das grutas, uma galeria caminhava até ao Castelo de Torres Novas. De todo impossível esta versão, quer a lenda dizer, como defendem outros, que dali se extraiu o tufo que em parte foi usado na construção de muralhas do burgo torrejano?
A verdade é que está por fazer um trabalho sistemático que desvende o mistério que as Grutas de Lapas encerram.
As sucessivas e diversas utilizações dadas às galerias, ao longo dos séculos, terão decapado eventuais restos arqueológicos que poderiam trazer alguma luz sobre o assunto.
Entretanto, permanecem o mistério e o carácter verdadeiramente singular das Grutas de Lapas, autêntico tesouro do património nacional.”

Texto e imagem extraídos de um folheto de divulgação do Município de Torres Novas.

Vou agora guiar-vos numa visita, em tom intimista, às Grutas de Lapas.


Estávamos em Agosto do ano passado. As informações sobre as grutas e sua localização foram recolhidas no posto do Turismo de Torres Novas.
Para se aceder às grutas, é necessário procurar o Sr. Vítor Manuel, homem da terra, quase sexagenário, e que foi incumbido pela autarquia de “olhar pelas catacumbas”; o que para ele consiste numa grande honra pois “recorda com satisfação as horas que passou com a rapaziada em brincadeiras lá dentro”.
Ao transpor o pequeno portão, a primeira impressão vai para o ar fresco que lá se respira, em contraste com a tarde de Verão que fica lá fora.
Entra-se num mundo diferente. Um mundo que, sabe-se, foi talhado pela mão do homem, mas que em tudo é natural e ao qual os pequenos focos de luz em nada retiram a sua escuridão entranhada. Toca-se nas paredes e sente-se rocha.


Uma pergunta, quase de imediato, assalta a mente “porquê esta encruzilhada de galerias, sem salas, apenas uma rede de caminhos que se cruzam?”, “sabe-se lá! Há tantas histórias…”
De repente apagam-se as luzes! “Não se assustem! Devem ser os gaiatos que gostam de pregar sustos à malta!” e lá vai o Sr. Vítor ligar o disjuntor, junto à entrada, num passo rápido de quem já não precisa de ver o chão que pisa…



“Isto por aqui deve ser pouco visitado, não?” resposta pronta “Nem pense nisso! Isto aqui tem muito movimento. Chegam-se a fazer aqui almoços e jantares para 30 ou 40 pessoas! Quem utiliza isto muito são os estudantes, a malta de Coimbra e esses assim. Até já se fizeram aqui Noites de Fado!”.
Ficámos também a saber que as grutas ocupavam uma área muito mais extensa mas que, ao longo do tempo, os donos das terras começaram a utilizar as galerias subterrâneas para os mais diversos usos, nomeadamente como armazéns, tendo sido “uma carga de trabalhos” convencer a população a deixar intacta aquela zona que ainda não tinha sido ocupada.
Depois de tirar umas fotos, para preservar a memória, voltámos para o calor da tarde, com uma fresca impressão de termos estado num sítio precioso.



Breves considerações finais

As Grutas de Lapas são consideradas Imóvel de Interesse Público, sendo já antiga a sua classificação (Decreto 32973, de 18-08-1943). Estão também consideradas no PDM de Torres Novas, no artigo 68º do seu regulamento (Servidão de Imóveis Classificados) aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 16/97.
O uso que delas é feito actualmente não parece ser o mais adequado, podendo eventualmente até contribuir para a sua degradação; mas, tratando-se agora de um uso essencialmente recreativo, não será uma forma de preservar este espaço, mantendo-o numa relação de proximidade com a população, evitando assim que a memória se apague?

Comments:
Há alguns anos atrás visitei estas 'grutas' e fiquei impressionada, por um lado com o relativo abandono a que estavam votadas e por outro pelo facto de ainda não se ter feito um trabalho sério de investigação, para tentar perceber a sua origem. Ou será que ele existe?
FA
 
Infelizmente não consegui encontrar nenhum estudo sobre a origem das grutas. As pesquisas que efectuei foram infrutíferas e não resultaram em nenhum acrescento significativo de informação.
Para tentar colmatar essa lacuna, enviei um e-mail à Câmara Municipal de Torres Novas solicitando colaboração nesse sentido.
 
Boa noite... Gostei do texto, no entanto não compreendo bem as considerações finais. Acho que a melhor forma de preservar as grutas é mesmo mostra-las às pessoas. A grutas têm uma relação forte com a cultura da população, mas acima de tudo, acho que é propriedade de todos os portugueses e não exclusivamente das Lapas.
Devia haver mais actividades nas grutas, noites de fado jantares, recriações históricas e mais eventos.
Obrigada pelo texto,
Pedro Antunes
 
Viva!

As minhas considerações finais apontam para a necessidade de se encontrar um equilíbrio entre a desejável utilização, seja ela recreativa ou outra, e a necessária preservação do local.
As grutas só terão importância enquanto tiverem significado para a comunidade, e para isso não podem ficar encerradas e votadas ao esquecimento. No entanto, temos também de ter em consideração a sua fragilidade,nomeadamente devido às carateristicas geológicas do terreno, pois se as queremos preservar para as gerações vindouras torna-se necessário garantir a sua manutenção; não nos podemos esquecer que o espaço visitável é o que resta de uma rede mais vasta que foi, entretanto, "absorvida" pelo uso que dela foi feito.
 
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